quinta-feira, 2 de agosto de 2012

O “mensalão” e a obsessão da mídia


Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:
O Globo estreou o seu novo design com um “especial mensalão”. Seus leitores foram brindados, pela bilionésima vez, com infográficos trazendo as carinhas de todos os acusados, resumos do processo, etc. Na segunda-feira, mais mensalão. E na terça-feira, a página 3 inteira do Globo é dedicada à Simone Vasconcelos, ex-secretária de Marcos Valério. Os repórteres do Globo vasculharam a vida da mulher, divulgando minunciosamente todos os detalhes de sua rotina atual: onde trabalha, em que escritório, nome de sócios, que tipo de trabalho faz, o nome dos clientes, o quanto cada um paga.
Enfim, o mensalão fez o Globo pirar novamente. Nesta terça-feira, três páginas inteiras sobre o “mensalão”. Na Folha, situação parecida, sem esse lado meio infantil do Globo. Merval Pereira, claro, fala de mensalão.
Eu fiquei divagando o que aconteceria se todo esse aparato midiático fosse usado para pressionar o Ministério Público a investigar os desvios detectados no processo de privatização.
O negócio é que o mensalão é uma obsessão da mídia. Ela também estará no banco dos réus. E ela está preocupada sobretudo com uma possível absolvição de José Dirceu e Genoíno, dois intelectuais importantes do Partido dos Trabalhadores, que hoje tem atuação discreta justamente porque aguardam uma decisão definitiva da justiça.
Absolvido, Dirceu voltará à vida política e partidária com muita força. Poderá voltar a presidir o seu partido, assumir um ministério e mesmo sonhar com uma eventual candidatura à presidência da república, em 2018.
O interessante em toda a cobertura da mídia é que ela age como se nada tivesse acontecido de 2005 até hoje. Como se não tivesse havido a prisão de Daniel Dantas, em primeiro lugar, e de Carlos Cachoeira, os dois principais quadros do crime organizado que estavam por trás de muitas das tramóias políticas armadas contra o governo durante aquela crise.
Daniel Dantas foi o principal fiador de Marcos Valério. Através de Dantas, que tinha o controle de algumas das principais empresas do país, Valério tinha acesso a crédito farto nos bancos, que usou para emprestar dinheiro para o PT. Com isso, Valério e Dantas aproximavam-se do poder. Quando Lula cortou as asas de Dantas, porém, iniciando um processo que culminaria com seu afastamento da presidência da Telemar, primeiro, e com sua prisão, mais tarde. o banqueiro se vingou patrocinando esquemas de ataque político ao governo federal, conforme se viu em algumas gravações.
Com Cachoeira, houve situação parecida. Os bicheiro irritou-se com as dificuldades que enfrentava para ter acesso aos esquemas de Brasília e deflagrou uma guerra, usando seu braço armado no Congresso, Demóstenes torres, e na mídia, a Veja. Boa parte dos escândalos do mensalão, inclusive aquele que o inaugurou, o flagra de Maurício Marinho recebendo uma bolada de 2 mil numa sala da sede dos Correios, foi armada pelo bando de Cachoeira e divulgada no pasquim do Civita.
O mensalão virou sim uma espécie de caso Dreyfus, porque o que interessa deixou de ser a verdade. Tornou-se antes uma guerra entre os barões da mídia e o PT. Entretanto, sabe o que é mais curioso? É que o escândalo acabou forçando o PT, a partir de 2005, a dar uma guinada à esquerda, para não perder o apoio popular. Essas dialéticas da política são lindas. A mesma coisa aconteceu em relação ao golpe do Paraguai. As lideranças do Mercosul, indignadas com o golpe branco no Paraguai, mas impotentes diante da astúcia da direita local, que conseguiu fazer tudo “dentro da lei”, deu o troco trazendo a Venezuela para dentro do Mercosul. Ou seja, a esquerda tomou um gol perdendo o Paraguai, mas marcou dois ou três incluindo Chávez no bloco.
Por isso aquele velho ditado ainda vale, e possivelmente valerá também para os setores que olham o mensalão como uma chance de resgatar eleitoralmente a direita: ri melhor quem ri por último.
Que o STF condene ou absolva quem for culpado ou inocente, mas que o faça sem ceder às chantagens da mídia. Que seja rigoroso, enfim, em todos os sentidos.

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